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Como a ciência está desenhando o que plantamos e comemos

Por André Sollitto

Lançamentos de novas variedades de legumes e frutas não são eventos que despertam tanta atenção do público quanto a apresentação de, digamos, um novo smartphone da Apple. Talvez merecessem, como demonstra a apresentação da Cosmic Crisp, uma maçã anunciada como a versão definitiva de uma das frutas mais consumidas no planeta. Sua chegada foi alardeada com uma enorme campanha de marketing que custou 10 milhões de dólares, contou com propagandas e influenciadores digitais – e mostrou ao mundo que o desenvolvimento de alguns alimentos que consumimos diariamente é um processo altamente tecnológico que guarda mais similaridades com o desenvolvimento de gadgets, celulares e outros dispositivos do que alguém poderia imaginar.

As redes de supermercados dos Estados Unidos estão recebendo carregamentos da Cosmic Crisp desde o final do ano passado. Como a Red Delicious, a Honeycrisp, a Granny Smith (a nossa maçã verde) e outras variedades de nomes curiosos, a novata foi desenvolvida para oferecer não apenas variedade ao consumidor, mas uma fruta com sabor e textura incomparáveis, cultivável em diversos climas e capaz de resistir a um ano se conservada em temperaturas adequadas. Não é, portanto, fruto do acaso.

Para chegar a esse resultado, o processo começou no final da década de 1990, com Bruce Barrett, pesquisador de maçãs na Universidade Estadual de Washington. A variedade WA38, que mais tarde seria batizada de Cosmic Crisp, foi escolhida entre mais de 10 mil híbridos por conta de suas características. Após a seleção, a candidata a chegar ao mercado passou por anos de aprimoramento e testes para que seu design se comprovasse  agronômica e comercialmente viável. Para se ter uma ideia, cada macieira precisa de dois a três anos para atingir o tamanho ideal. Os cientistas comparam centenas de indivíduos até encontrar aquele com todas as características desejadas, seja a resistência a alguma doença, a capacidade de crescer em climas variados ou os sabores e as texturas específicas. Quando o indivíduo ideal é encontrado, ele é clonado e testado em campo, com produtores parceiros.

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Nos Estados Unidos, as sementes são patenteadas, bem como o nome da fruta. No caso da Cosmic Crisp, oferecida para agricultores americanos comercialmente pela primeira vez em 2017, o Estado de Washington tem a patente e a exclusividade de plantio por 10 anos – ou seja, elas ainda vão demorar um pouco para chegar ao Brasil. Os produtores também precisam pagar royalties para cada árvore plantada ou caixa de maçãs vendidas. E se engana quem pensa que os produtores ficam com o pé atrás por conta dessas taxas: mais de 13 mil árvores já foram plantadas, a um custo de US$ 500 milhões.

As quantias investidas, bem como o longo processo de pesquisa e até a campanha de divulgação remetem ao desenvolvimento de outros produtos tecnológicos. A campanha de marketing, por exemplo, recrutou até Leroy Chiao, astronauta aposentado da NASA, para fazer propaganda. A fruta tem site e até slogans, como “Imagine as possibilidades” e “A maçã dos grandes sonhos”.

Parece exagero, mas é um exemplo claro de toda a tecnologia que envolve a produção de alimentos. E os resultados parecem ter sido promissores: críticos gastronômicos que provaram a Cosmic Crisp dizem que ela tem um sabor levemente doce com um toque azedinho que supera outras variedades. E cada mordida produz um som que parece saído de um desenho animado – o barulho que se espera ao morder uma maçã. É o que o jornal americano “The News York Times” chamou de “a maçã do futuro”.

Leia a reportagem completa no site da revista Plant Project