O fim do açúcar
Startup israelense lança molécula 3000 vezes mais doce que o açúcar e promete redução de até 70% do seu uso em alimentos
A biologia sintética golpeia a cadeia do açúcar global com um composto natural 3000 (três mil) vezes mais doce e sem os efeitos colaterais da sacarose e dos adoçantes sintéticos, como a obesidade e a sensibilidade dos portadores de diabetes. Quem atesta isso é Lisa Melton em recente matéria na Nature Biotechnology. Segundo Melton a molécula trata-se de uma proteína que foi engenheirada por uma startup de biologia sintética. A empresa de nome Amai Proteins acaba de finalizar uma rodada inicial de investimentos da ordem de US$ 100 milhões de dólares (~ 500 milhões de Reais) para lançar seu produto no mercado. A startup é de base Israelense e é liderada por Ilan Samish, que se declara um empreendedor multidisciplinar e expert em design computacional de proteínas, geneticista, bioquímico e biologista da computação. Samish realizou seu pós-doutorado na University of Pennsylvania e atuava no Weizmann Institute of Science.
Naturalmente pela solução que desenvolveram a empresa de biotecnologia tem como objetivo a redução do épico consumo de açúcar no mundo, conforme atesta a matéria da Nature Biotechnology. A Amai Proteins espera que pelo menos 70% de todo o açúcar [a base de sacarose] possa ser substituído pela molécula que foi desenvolvida.
A molécula foi inicialmente descrita em uma espécie de fruta da região tropical, encontrada principalmente na linha do equador e se trata de uma proteína. Em uma rápida busca, a proteína de nome Monellin foi descrita pela primeira vez em 1969, após ser extraída da planta com nome científico Dioscoreophyllum cumminsii. Embora não se saiba se essa é a fonte para a proteína trabalhada pela Amai Proteins. A Monellin consegue se ligar aos mesmo receptores que o açúcar tradicional e por isso produz a mesma sensação no paladar. Entretanto, o desenvolvimento da proteína para fins industriais não foi óbvio e nem simples. Por se tratar de uma proteína de aproximadamente 10 kDa e duas cadeias de aminoácidos, sendo a cadeia A com 44 e a cadeia B com 50 aminoácidos, a estrutura se desnatura quando a temperatura atinge os 45 oC, o que é muito baixo para a indústria de alimentos e portanto, inviabiliza seu uso, uma vez que perde suas propriedades químicas em temperaturas superiores a essa.
O que a Amai Proteins fez foi se utilizar de um método chamado AI-CPD (Agile Integrative Computational Protein Design) que no português soaria como Design de Proteínas pelo Método Computacional Integrativo Ágil em tradução livre. Segundo Melton a empresa se inspirou nos organismos termófilos ou seja aqueles capazes de viver em altas temperaturas, e com isso modificou algumas regiões na estrutura da proteína para que ela pudesse suportar a altas temperaturas sem perder suas propriedades químicas. Para isso, os pesquisadores olharam profundamente para as condições de pH, salinidade e obviamente a temperatura, em que vivem os organismos extremófilos para entender o que precisaria ser mudado. A decisão de onde mexer na estrutura da proteína se deu exatamente pelo uso do AI-CPD. E o experimento foi bem sucedido. A partir de então o gene codificador da Monellin melhorada foi colocado em uma levedura para produzir a molécula em grande quantidade. Segundo Samish, essa seria a parte mais simples, uma vez que “para nós, a fermentação é simplesmente como produzir cerveja”, tal como aparece na matéria de Melton. A levedura é produzida pelos métodos tradicionais, sendo que a seguir a produção é colhida e a proteína é isolada formando um tipo de farinha branca que foi chamada de Sweelin.
Os testes da Sweelin foram um sucesso chegando a substituir 70% do açúcar utilizado no ketchup e 50% do açúcar utilizado no chocolate e sem alteração nos sabores e na palatabilidade como atestou os supertasters ou superprovadores, que são pessoas com uma habilidade natural de detectar a mínima diferença no sabor de alimentos. O produto logo despertou o interesse de gigantes do setor de alimentos, como Danone, Pepsico e Strauss que aparecem listadas como parceiros ou colaboradores da Amai Proteins. A Sweelin aguarda apenas o recebimento do status de Generally Recognized as Safe (Reconhecimento Geral de Segurança) que deve ser emitido pelo US Food and Drug Administration para entrar em operação comercial.
A grande diferença dessa molécula para o açúcar convencional é a forma como ele atua no organismo. Primeiramente sua base química, onde o Sweelin é uma protéina e o açúcar é um carboidrato. Desta forma há de imediato uma mudança na forma como essas substâncias interagem com a flora instestinal, sendo quase improvável que a Sweelin tenha algum tipo de interação. Segundo, e talvez ainda mais impactante é a interação com portadores de diabetes, já que por se tratar de uma proteína, a Sweelin é digerida no organismo na forma de aminoácidos e não desencadeia uma reação de resposta a insulina. Essa propriedade tem uma relevância altíssima frente aos apelos globais por alimentos com menos açúcar e consequentemente menos agressivos à saúde.
Por fim, Samish flecha com um afirmação de que “a velha agricultura não pode ser mais sustentada e que precisamos produzir novas proteínas saborosas, saudáveis, econômicas e sustentáveis para o mercado de alimentos em massa a partir do design molecular. E é isso que a biologia sintética faz”.
Editado por
Mateus Mondin
Professor Doutor
Departamento de Genética
Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – ESALQ
Universidade de São Paulo
Editor Chefe da StartAgro