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Pequenas experiências que moldam um perfil de sucesso

            Quando conversamos com Saville Alves, sócia co-fundadora da SOLOS, uma startup de Salvador na Bahia, entendemos na prática o que é empreendedorismo de sucesso. Nossa conversa começa com Saville contando um pouco sobre suas vivências, algumas ainda quando criança, mas que dão vida a uma escalada de conquistas que chegam até a criação de sua própria startup.

            Seria possível aprender lições sobre gestão e liderança ainda na escola? Pode até parecer fora de contexto, mas quando de trata de Saville não. Ela nos conta que já na quinta série, foi eleita representante de classe e por conta disso teve que participar de reuniões com a coordenadora da escola. Essa experiência fez com que aprendesse muito cedo a fazer concessões e conciliar interesses. Foi dessa experiência juvenil que nasceu a percepção do papel da representatividade que uma liderança carrega.

            Anos mais tarde, já estudante na Universidade Federal da Bahia, ela se percebe em um ambiente mais diversos. Apesar das segregações nessa comunidade, Saville habilidosamente desenvolveu laços com pessoas de diferentes realidades e muitas vezes contrastantes a dela. É nesse universo novo que ela passa por experiências ainda mais significativas, que a moldam para sua vida profissional. Há que se destacar sua passagem pela UNIJr-BA (Federação de Empresas Juniores da Bahia) onde pôde sentir mais de perto a prática do que seria o seu dia a dia. Nasce então o seu desejo de trabalhar no mundo corporativo, sendo incentivada pelo seu professor Claudio Cardoso.

            Já no final da graduação, havia alcançado seu grande desejo e estava trabalhando em uma grande empresa. Nesse momento Saville relata que começou a entender “o quanto este tipo de trabalho é visceral, com cobranças muito altas, mas também com muita diversidade de ferramentas e instrumentos possíveis, os acessos, tudo é muito fácil, o que torna essa experiência muito enriquecedora em diversos sentidos”.

            Com o passar do tempo, apesar de todo esse instrumental que a vida corporativa lhe oferecia, sentiu uma perda de identidade e que era hora de alcançar novos mundo. Após uma temporada morando em Madri, ela volta ao Brasil e se envolve com uma organização internacional chamada Teto, que trabalha com sistemas de desenvolvimento colaborativo social, focado na questão de habitação. Um famoso projeto da Teto é o da construção de moradias emergenciais em apenas 2 dias em parceria com moradores em situação de vulnerabilidade.

            Essa experiência trouxe uma consequência dura, porém positiva na vida de Saville, a quebra de paradigmas. O projeto exigiu que ela conhecesse e frequentasse dois lados diferentes da mesma cidade. Conhecer e trabalhar na periferia de Salvador foi transformador. Foi lá que todas as experiências vividas começaram a se encaixar e a fazerem mais sentido. Nasce então o propósito empreendedor e Saville reconhece que isso foi resultado de cada um desses degraus que pode subir ao longo de sua vida.

            Sem deixar a Teto, Saville se junta com Gabriela Tiemy, sua colega de trabalho para juntas fundarem a SOLOS. A startup é a somatória de experiências das duas empreendedoras.

Gabriela Tiemy e Saville Alves (da esquerda para direita), juntas em evento.

 

            A SOLOS inicia-se então, sem dúvida nenhuma, com uma missão de natureza grandiosa: reduzir o desperdício de alimentos. A primeira ideia, para resolver essa questão, seria a de um aplicativo, conectando pessoas necessitadas a promoções nos cardápios de restaurantes, que estivessem próximos do horário de fechamento e quando dezenas de quilos de alimentos são simplesmente jogados no lixo por falta de consumidores. Entretanto, a ideia não foi levada a diante. O principal motivo? Falta de conectividade! Principalmente da parte das próprias idealizadoras, que na época não tinham aderido a nenhuma rede social ainda.

            Então, as ideias começam a migrar para outra vertente, sempre focadas na linha de evitar ao máximo os desperdícios. Sendo assim, outra possibilidade surge a partir do contato da Saville e da Grabriela com o conceito das composteiras, as quais fazem as meninas pensarem em focar nos resíduos de alimentos gerados nos grandes centros urbanos, entendendo que o mais interessante seria tratar deste material orgânico no próprio local em que eram gerados, isto é, nas cidades em si,  e  utilizando o material tratado para produções de alimentos em espaços ociosos dos próprios centros urbanos, assim aproximado as produções de alimentos aos seus consumidores, além de criar um ciclo de mínimo desperdício.

            Com um projeto bem escrito, ambicioso e com um apelo mais do que justo, elas passam a se inscreverem em editais de concursos e competições, e em um destes editais, são selecionadas para um programa de pré-aceleração. Essa seleção representava mais do que uma conquista, pois o programa ocorreria em São Paulo, teria duração de 6 meses e elas eram as únicas selecionadas de fora do Estado de São Paulo. Esse foi o passaporte para que, Saville e Gabriela, entrassem no mundo das statups com um apoio muito grande fornecido pelo programa. A própria Saville brinca que elas tiveram acesso a uma verdadeira universidade para startups.

            Ao final dessa vivência, as meninas voltaram para Salvador. Na bagagem trouxeram a clareza do que sempre tiveram em mente, que o problema era o lixo. Esse problema afeta diretamente as populações mais vulneráveis e no nordeste brasileiro essa questão é ainda mais pronunciada, resultado da acentuada desigualdade nos centros urbanos.

            Finalmente, no início de 2018 a SOLOS sai do papel. Nos primeiros 7 a 8 meses da empresa, as empreendedoras focaram na prospecção de clientes em uma operação no formato B2B. Surge então um novo desafio, como convencer empresas que não têm atenção com o desperdício de alimentos, a entrarem no projeto?

            Com espírito empreendedor aflorado, as duas batem na porta do secretário da pasta de sustentabilidade da prefeitura de Salvador e ele as atende. O secretário sugere rodar uma POC (prova de conceito) em uma escola. Para isso, a secretaria de sustentabilidade forneceu os insumos, para que a POC fosse desenvolvida, porém sem remuneração diretas para a SOLOS. Saville e Gabriela não pensaram duas vezes e toparam o desafio, o que imediatamente trouxe muito repercussão na mídia e consequentemente o interesse de empresas como a Braskem.

            Logo depois a So+ma vantagens, startup de São Paulo focada em reciclagem, que estava planejando implementar um projeto na Bahia, procurou a SOLOS para uma parceria. Então mais uma pivotagem estava a caminho, e o que antes seria compostagem, passou a ser reciclagem. A chave do sucesso de uma startup é sem dúvida alguma a sua capacidade de pivotar rapidamente. E desta vez a mudança de foco da empresa foi o principal impulsionador. Prova disso, foi a aprovação da startup em um edital do SEBRAE focado em cidades sustentáveis. O início da operação deste projeto, trouxe a tão esperada visibilidade e a SOLOS passou ser requisitada para serviços por inúmeras empresas e atualmente se encontra em franco crescimentos.

            Saville é a personificação do que é ser empreendedor. Começando das pequenas ações, passando pela busca constante por uma identidade, se envolvendo e dedicando tempo ao trabalho de forma incansável até o sucesso. Essa trajetória permitiu com que ela encontrasse pessoas incríveis e descobrisse aquilo era de fato seu propósito de vida. Muitas vezes nós achamos que não, mas cada uma das nossas experiências, sejam grandes ou pequenas, são pequenos degraus que nos levam para mais perto do sucesso, como a SOLOS.